Ads 468x60px

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

O NOME DO PAI É PRECISO




   

Cecília Dionizio


A palavra ‘desconhecido’ no espaço onde deveria constar o nome do pai na certidão de nascimento de uma criança pode trazer mais transtornos psicológicos a um futuro adulto do que se possa imaginar numa rápida análise. Muito embora a Lei 8560, de dezembro de 1992, exija que não se registrem crianças sem o nome do pai, ainda hoje essa é uma realidade. “A lei de 1992, somente agora vem sendo efetivamente cumprida, notadamente, a partir da promulgação do novo Código Civil. Ao que parece, enfim, o direito previsto na Constituição e no Estatuto da Criança e do Adolescente está sendo levado em consideração”, acredita a advogada Elaine Ferreira, de Rio Preto. Isso, em parte, deve-se ao fato de haver sido feito um levantamento oficial pelo promotor da Infância e Juventude de Mirassol, José Heitor dos Santos, que constatou que o problema afeta diretamente cerca de 700 crianças só naquele município. “Esta pode ser a razão de haver tanto menor envolvido em atos infracionais, apresentando problemas escolares, entre outros”, afirma.

Como a investigação quanto ao suposto pai pode ser feita por iniciativa do Ministério Público, ações como a de Mirassol estão se propagando no Estado de São Paulo e muito em breve deverão se espalhar pelo País, uma vez que até maio Heitor Santos promete ter resolvido boa parte das cerca de 700 certidões de Mirassol. Contudo, esse é um benefício que pode ter um lado ainda mais perverso. “Já ouvi várias mães, dizendo que não iriam registrar seus filhos enquanto o pai não assumisse a paternidade, deixando assim o criança sem a documentação legal”, diz o escrevente Luciano P. Souza, do cartório de Engenheiro Schmitt. Em Rio Preto, um dos principais cartórios da cidade, onde são feitos cerca de 200 registros ao mês, em média 60 certidões/ano não têm o nome do pai. “Há casos em que a mãe não sabe quem é o pai. A solução, então, é encaminhar a declaração criminal assinada por ela ou testemunhas, para que o assunto seja tratado no fórum adequado”, diz Sérgio Donizeti Paschoal, oficial substituto do primeiro cartório civil de Rio Preto.

A também advogada Maria Aparecida Pasqualão, de Rio Preto, que já acompanhou centenas de ações de reconhecimento de paternidade, confirma que toda mãe é obrigada a indicar o nome do pai ou suposto pai numa declaração à parte, caso este não queira assumir ou tenha algum outro impedimento. “Ainda que não tenha certeza da paternidade, terá de indicar o nome”, alerta. Pasqualão explica que o oficial (do cartório de registro civil) remete ao juiz certidão integral do registro da criança tida fora do casamento, juntamente com os dados do suposto pai, a fim de ser averiguada ‘oficiosamente’ a procedência da alegação. O suposto pai será notificado (independente de seu estado civil) para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída. “Se o suposto pai não atender a notificação judicial no prazo de trinta dias, o juiz remeterá os autos ao representante do Ministério Público para que este, havendo elementos suficientes, intente a ação de investigação de paternidade.

O objetivo disso tudo é evitar que no futuro a criança, cujo pai não foi declarado no momento do nascimento, venha a sofrer as conseqüências desse ato falho. É exatamente isso o que confirma a psicóloga de crianças Rosana Zanela, de São Paulo, que embora admita não ter feito uma pesquisa sobre o assunto, não tem dúvidas do quão importante é, para a criança, ter o nome do pai no registro de nascimento. “Ainda que este pai seja ausente, ela poderá sentir-se discriminada no futuro, quando precisar apresentar seu registro de nascimento, fazer sua carteira de identidade, enfim, qualquer documento em que seja necessário o nome do pai”, diz. Para a psicóloga, é preciso compreender que ainda na infância, já há sofrimento com a ausência do pai, pois uma criança, para crescer saudável, precisa da figura masculina do pai, ou ao menos de alguém que o substitua e que exerça a função paterna. “É preciso entender que a falta do nome do pai no registro pode estigmatizar a criança e fazer com que ela se torne uma pessoa insegura, pois toda vez que apresentar um documento mostrará ser filho de pai desconhecido”, diz.

Além disso, a psicóloga lembra que a sociedade pode ser cruel sobre isso, assim como todas as pessoas em condições de exclusão. Porém, ela recomenda que se for uma situação de fato e não tiver como dar o nome do pai, é importante contar à criança o motivo dessa ausência e buscar oferecer um suporte psicológico para que ela cresça aprendendo a dar valor às suas próprias qualidades como pessoa. “É importante, então, que a criança aprenda desde cedo a reconhecer suas próprias potencialidades e que possa ser feliz no convívio de uma família que a ame, com pessoas que possibilitem a ela um crescimento saudável”, conclui.

Serviço:
- Rosana Zanella, psicóloga especialista em crianças, fone (11) 4221-4045
e-mail:r.zanella@uol.com.br
- José Heitor dos Santos, promotor da Infância e Juventude de Mirassol, fone (17) 242-3015
- Elaine Ferreira, advogada, fone (17) 234-5488
- Maria Aparecida Pasqualão, advogada, fone (17) 232-9422

Entenda melhor:

:: A Lei exige o comparecimento do pai e da mãe para fazer o registro. Na ausência do pai, pode-se levar um documento público ou com firma reconhecida anuindo a paternidade. No caso de mãe solteira, prevalece o determinado na Lei 8560/92, ou seja, no ato do registro a mãe tem de informar o maior número de dados sobre o suposto pai (nome, profissão, endereço etc). Ao oficial do cartório cabe enviar o documento ao juiz para que se apure a paternidade

:: O sobrenome do pai é obrigatório, e o da mãe, facultativo. No caso das mães solteiras, pode-se colocar o sobrenome da mãe, mas assim que houver o reconhecimento de paternidade, o nome deverá ser alterado

Fonte - Elaine Ferreira, advogada em Rio Preto, com base na Lei n. 8560/92, que regula a investigação de paternidade dos filhos tidos fora do casamento

Saiba mais:

:: A mãe pode registrar seu filho somente em seu nome, mas declarar ao oficial do cartório se deseja denunciar a paternidade ou não. Por exemplo, se uma mãe declara o nome do suposto pai, ela assina uma denúncia que é, posteriormente, enviada ao Juiz Corregedor do Cartório e esse, juntamente com o Ministério Público, irá ouvir denunciante e denunciado. Se a mãe não denunciar a paternidade, será ouvida da mesma forma

:: Não há custo algum para o registro, bem como os trâmites de denúncia/renúncia são gratuitos

:: O Código Civil prevê um prazo de cinco a quarenta e cinco dias para que a criança seja registrada, porém não existem mais multas para quem excede esse prazo

0 comentários:

Postar um comentário