Preso por ter sementes, folhas secas e maconha prensada, um senhor de 70
anos foi absolvido pela juíza Luana Cavalcante de Freitas, da Vara do Único
Ofício do Quebrangulo (AL), depois de ter sido provado que as substâncias eram
para consumo próprio. O idoso sofre de câncer de próstata e passou a usar a
droga para reduzir os efeitos da doença, mas sem prescrição médica.
Além de folhas e sementes, idoso também foi preso com maconha prensada.
Em abril de 2015, a Polícia Militar alagoana recebeu uma denúncia de que
existia plantação de pés de maconha na casa do idoso. Ao fazer uma diligência
no local, encontraram 42 gramas de sementes de maconha, 42 gramas da droga
prensada e 128 gramas de folhas secas da planta.
A defesa do idoso argumentou que o rito estabelecido na Lei de Drogas (11.343/2006)
foi desrespeitado. O Artigo 28 da norma determina que “quem adquirir, guardar,
tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas
sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar” será
advertido sobre os efeitos da substância, prestará serviços à comunidade e
cumprirá medida educativa.
A defesa do idoso também alegou que não há nenhum exame toxicológico nos
autos e pediu que a conduta fosse considerada atípica. Ao se manifestar, o
Ministério Público de Alagoas pediu a desclassificação do crime de tráfico para
porte de drogas para consumo pessoal.
Para inocentar o réu, a juíza citou o princípio da lesividade, segundo o
qual uma conduta só pode ser considerada crime quando se ajustar ao tipo penal,
sob o ponto de vista formal (adequação do fato à norma), e demonstrar
relevância material. “Ou seja, é a conduta que provoca uma lesão ou ameaça de
lesão intolerável ao bem jurídico tutelado”, explicou.
De acordo com Luana de Freitas, o princípio da lesividade está
diretamente ligado ao da alteridade, que define como conduta criminosa apenas
aquela que lesiona ou ameaça bem jurídico de terceiro. “Se a conduta não extrapola
o âmbito individual, o Estado não pode criminalizar a conduta. Por conta desse
princípio que não existe punição para tentativa de suicídio ou autoflagelo”,
comparou a juíza.
Estudos e pesquisas
A juíza destacou em sua decisão que o tema é controverso e que inúmeros estudos
científicos comprovam que a maconha possui um grau de nocividade e dependência
mais baixo do que o álcool e o cigarro.
“Não parece que se possa extrair a conclusão de que o uso abusivo da
maconha pode ocasionar danos a saúde, como ocorre, aliás, com qualquer
substância, e não apenas com os entorpecentes, como com o açúcar”, disse a
juíza, complementando que outras tantas pesquisas comprovaram que a droga em
questão tem benefícios terapêuticos que ajudam a reduzir os efeitos de doenças
como câncer, aids, glaucoma, esclerose múltipla e epilepsia.
Destacou ainda que países como Portugal, Espanha, Canadá, Uruguai,
Holanda, Israel, além de alguns estados dos EUA estão legalizando o uso
medicinal e recreativo da maconha. “Uma vez que levam em consideração que os
benefícios superam os malefícios e a sua proibição contribui para o aumento do
tráfico de drogas.”
Luana de Freitas também respondeu aos argumentos de que, em casos como
esse, o bem jurídico violado seria a saúde pública: “Soa incoerente, uma vez
que existem drogas lícitas que matam milhares por ano, sendo necessário um
gasto enorme do dinheiro público por conta disso. Ademais, criminalizar o uso
de drogas acaba afastando os usuários do sistema de saúde, principalmente pelo
estigma que carrega o usuário”.