O réu tem direito de fazer pedidos na própria contestação de
ação reclamatória trabalhista que tramita sob o rito sumaríssimo. E cabe ao
juiz apreciá-los junto com as pretensões do reclamante. A possibilidade está
prevista no parágrafo único do artigo 17 da Lei 9.099/1995, que dispõe sobre as
regras nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Sob o amparo desta fundamentação, a 1ª
Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (Rio Grande do Sul) reformou sentença que extinguiu o pedido de dano moral
no valor de R$ 4 mil, feito pela patroa contra a ex-empregada doméstica, após a
improcedência da reclamatória.
A juíza Sônia Maria Pozzer, da 14ª Vara do Trabalho de Porto
Alegre, extinguiu o contrapedido da patroa, sem resolução de mérito, por
impossibilidade jurídica, como prevê o artigo 267, inciso VI, do Código de
Processo Civil (CPC). Para a julgadora de origem, o contrapedido só é viável,
no processo trabalhista, nos casos de ação de consignação em pagamento. E há a
possibilidade formal da reconvenção — o que não foi feito pela parte ré
naqueles autos. Assim, para a juíza, no caso concreto, ficou patente a
‘‘inadequação da via eleita’.
A figura do pedido contraposto, como forma de simplificar a
solução dos conflitos, foi admitida no acórdão 0000400-73.2011.5.04.0751,
relatado pelo desembargador Wilson Carvalho Dias, informou o relator do recurso
interposto pela ré, Marçal Henri Figueiredo. ‘‘Tal posicionamento é justificado
pelos princípios da celeridade e informalidade, os quais estruturam a
sistemática do processo do trabalho e permitem uma maior maleabilidade na
prática dos atos processuais, com maior pertinência ao rito sumaríssimo em
razão da simplificação do procedimento comparado ao rito ordinário’’,
explicou no acórdão.
Provido o recurso, Figueiredo reconheceu que as mentiras ‘‘aplicadas’’
pela ex-empregada — para justificar as sucessivas faltas ao trabalho — violaram
o princípio da boa-fé contratual, causando grande mágoa à parte reclamada. ‘‘A
lesão extrapatrimonial (moral) sofrida pela reclamada está evidenciada na
transcrição da Ata Notarial, que deixa clara sua preocupação e
envolvimento com a situação da reclamante, sempre demonstrando carinho,
compreensão, tanto com ela como com seu filho, para, logo após, ser
surpreendida com a prova das mentiras perpetradas durante meses do contrato,
que serviram, inclusive, para justificar ausências e conseguir adiantamentos de
salário’’, ponderou.
Ao invés dos R$ 4 mil pedidos na
contestação, Figueiredo achou por bem arbitrar o quantum indenizatório em R$ 3.447 — o mesmo
valor da causa. A autora ainda foi multada por litigância de má-fé — 1% sobre o
valor da ação —, nos termos dos artigos 17 e 18 do CPC. ‘‘A reclamante, além de
ter causado prejuízos de ordem moral, se valeu do processo judicial para obter
um fim indevido, pois por certo sabia, em decorrência do grande número de
faltas ao trabalho, que não tinha direito ao pagamento de verbas rescisórias’’,
fulminou o relator. O acórdão, com entendimento unânime do colegiado, foi
lavrado na sessão do dia 8 de julho.
O caso
O imbróglio trabalhista teve início quando a desembargadora Lúcia de Fátima
Cerveira, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, contratou como empregada
doméstica Ângela Maria dos Santos Oliveira. Esta trabalhou na casa
da desembargadora no período de 18 de fevereiro a 24 de novembro de 2014.
Mas não de forma contínua.
Neste interregno de tempo, a empregada faltou o trabalho em
diversas oportunidades. E deixava recados nas mensagens de celular, sempre
reportando situações de dificuldades familiares, morte e doenças. A patroa, em
resposta, sempre se prontificava a ajudá-la, demonstrando apreço e preocupação.
E, não raro, atendia seus pedidos de adiantamento de dinheiro, para tirá-la do
‘‘aperto’’.
Desconfiada do excesso de desculpas, a patroa contatou a General
Motors, em Gravataí, para saber se tinha ocorrido algum acidente de trabalho
com o filho da autora. Como a resposta foi negativa, teve a percepção exata de
que estava sendo ludibriada na sua boa-fé, pois fora informada que o rapaz
estaria à beira da morte. Inclusive, no final do contrato, a autora usou a
falsa doença do filho como justificativa para pedir dispensa, já que queria
cuidar de sua saúde em outra cidade. Entretanto, como faltara em excesso e não
completara um ano de contrato, a rescisão veio zerada. Ou seja, não tinha nada
a receber de verbas rescisórias.
Contrariada, a autora ajuizou reclamatória na 14ª Vara do
Trabalho de Porto Alegre. A atitude da ex-empregada surpreendeu a desembargadora,
que reagiu. Levou o seu celular até o 5º Tabelionato de Notas da Capital e fez
o registro notarial das conversas mantidas com a reclamante, posteriormente
anexadas ao processo. Fez constar estas conversas na peça de defesa, para
reforçar o argumento de quebra da boa-fé.
Feitas as contas, a vara julgou a demanda improcedente.
‘‘Autorizado, ainda, o desconto relativo ao aviso-prévio que deixou de ser
cumprido pela trabalhadora, no valor de R$ 1.200, donde sobrevém saldo negativo
a título de parcelas rescisórias (R$ 1.160 - R$ 1.200 = - R$ 40). Pelo exposto,
entendo que nada há o que ser deferido em favor da autora’’, concluiu a juíza
Sônia Maria Pozzer. Ela, no entanto, extinguiu o contrapedido patronal — o que
foi reformado pelo TRT-4.
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