A simples cobrança, ainda que insistente e incômoda, não motiva
indenização por dano moral se não houve inscrição em cadastro de
inadimplentes. Esse foi o entendimento aplicado pela 2ª Turma Recursal dos
Juizados Especiais do Distrito Federal ao reformar sentença que havia condenado
um banco a indenizar um defensor público cobrado indevidamente por meses devido
à dívida de um homônimo.
Diante da cobrança insistente, o consumidor ingressou com ação no
Juizado Especial do DF pedindo que fosse reconhecida a inexistência do contrato
alegado pelo banco e que a instituição financeira fosse condenada a indenizar
por danos morais devido às inúmeras cobranças.
Na sentença,
foi reconhecido que o defensor nunca assinou o contrato e a instituição
foi condenada a pagar R$ 6 mil pelos danos sofridos pelo consumidor devido às
cobranças. Em recurso, o banco reconheceu que o contrato foi assinado por um
homônimo, porém pediu que fosse revista a condenação por danos morais.
Ao julgar o recurso, a Turma Recursal do TJ-DF afastou a indenização.
Segundo o colegiado, houve falha na prestação de serviço. Porém, como não houve
a inscrição do nome do consumidor em cadastro de inadimplentes, não há razão
para o pagamento por danos morais.
"A simples cobrança, ainda que insistente e incômoda, não
rende ensejo ao dano moral se não houve inscrição do devedor em cadastro de
inadimplentes”, diz o acórdão,
citando jurisprudência do TJ-DF.
Para o defensor público Luiz Cláudio de
Souza, autor da ação, com esta decisão o tribunal deu carta branca às
empresas para incomodem o cidadão. Com isso, segundo Souza, deve aumentar o
número de ações questionando as cobranças que serão feitas.
"Como sentem-se seguros de que não serão obrigados a ressarcir os
consumidores, os empresários continuam adotando as mesmas práticas abusivas,
gerando aborrecimentos de toda ordem ao consumidor, o que acaba levando a
questão ao Poder Judiciário, que a seu turno, julga improcedentes os pedidos do
autor. Este ciclo vicioso acarreta a propositura de centenas de milhares de
ações que abarrotam o Poder Judiciário".
Como solução, Luiz Souza propõe que o Judiciário passe a aplicar a máxima
proteção ao consumidor, fixando uma indenização mínima até mesmo nos casos
considerados como mero dissabor.
"O importante, ao final, é que qualquer prática abusiva fosse
penalizada, pelo mínimo valor que fosse, de modo a estimular os empresários a
melhorar suas práticas, o que acarretaria, inevitavelmente, a diminuição do
número de demandas consumeristas", afirma.
Para a advogada Ana Paula Oriola de Raeffray, sócia do Raeffray
Brugioni Advogados e especialista em Direito do Consumidor, a questão de exigir
negativação para que seja confirmado o dano não é pacífica e decisões nesse
sentido vêm despontando devido ao excesso de pedidos de dano moral.
"Tanto as pessoas que tem uma efetiva violação de direito, quanto
as que não tem, pleiteiam e recebem indenização por danos morais. O dano moral,
como qualquer caso de apuração de responsabilidade, deve existir de fato, ou
seja, deve haver a ação que guarde nexo com a punição. O incômodo não pode ser
tomado como dano moral", afirma.
O fato de uma empresa ser condenada a indenizar, aponta Ana Paula,
também não significa necessariamente que as empresas vão melhorar seus
serviços. "A pior face deste impasse é que o dano moral acaba sendo pago
inclusive pelo consumidor que vive de receber indenização e esta é uma realidade.
A eficácia em face da empresa é por exemplo a propaganda negativa, a divulgação
do serviço mal prestado. A indenização por dano moral somente deve incidir
quando houver efetivamente o dano", conclui.
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