A tese de coerção irresistível defendida pelo advogado Edmundo Cavanezziconvenceu os sete jurados presentes
na Vara do Júri de Rio Claro (SP) a absolver seu cliente, Roberto, pelo crime
de homicídio doloso contra o próprio irmão, Geraldo. A decisão põe fim ao
trágico caso de fratricídio, pois o Ministério Público informou à defesa que
não irá recorrer.
Geraldo era tetraplégico e, dizendo se sentir um peso na vida da
família, pediu que a mulher e o filho saíssem de casa. Em depressão profunda,
passou a pedir que o irmão o matasse, para se libertar do sofrimento. No
início, Roberto relutou, mas a forte insistência do irmão fez com que eles
elaborassem um plano de simulação de assalto que terminaria com a morte de
Geraldo, que financiou a compra da arma.
“Apresentei ao júri a tese de coerção irresistível, pois foi um conjunto
de situações que pressionaram Roberto a atender o pedido. Geraldo cobrava o
irmão de tirá-lo daquela situação, pois teria sido ele que o colocou nela, ao
chamá-lo para a corrida de carro que resultou no acidente que o deixou
tetraplégico. Os dois vinham de uma família de forte patriarcado e Geraldo era
o irmão mais velho. Por isso não poderia ser desobedecido. Essa cobrança era
diária”, afirmou Cavanezzi em entrevista à ConJur — ele atuoupro bono no caso.
O advogado conta que Roberto passou a assistir filmes como Menina de Ouroe internalizar o conceito de que
assassinar um ente amado para livrá-lo de sofrimento pode ser um ato de bondade
e humanidade. “Essas obras calaram fundo na psique dele”, diz o defensor.
Vida indigna
Um conceito que Cavanezzi apresentou ao júri, mas não pôde utilizar como tese,
é o da eutanásia. A prática de provocar a morte a um doente que não tem cura
não é permitida no Brasil. Por aqui, apenas é possível a ortotanásia, que
consiste na interrupção do tratamento. “Temos uma legislação muito atrasada
quanto ao tema, mesmo comparando com países da América do Sul”, opinou.
Cavanezzi ressaltou ao júri que apesar da eutanásia não ser permitida, a
Constituição falar em direito a vida, não em dever de viver. “É humano aceitar
a eutanásia, pois o Estado não pode obrigar o sujeito a viver uma vida indigna.
A vida não deve ser um processo penoso”, disse.
Consequência como pena
Outro ponto levantado pelo advogado junto aos jurados foi o do perdão judicial.
“O exemplo clássico é a mãe que deixou o filho no banco do carro e a criança
acaba morrendo. Ela cometeu um homicídio, mas as consequências do ato são
piores do que a pena. Roberto é um homem que transpira tristeza por ter matado
o irmão. Ele vai carregar esse peso para o resto da vida. Acho que se ele não
tivesse se casado novamente, já teria se matado”.
O júri acatou a tese da coerção irresistível, o que agradou ao advogado:
“Neste caso a Justiça admite que não existiu culpa. Para haver perdão, tem que
existir culpa, e ser considerado culpado pesaria na consciência de Roberto”.
O Ministério Público queria que Roberto fosse considerado culpado por
homicídio privilegiado, que é caracterizado quando é praticado sob o domínio de
uma compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante
valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a culpa do homicida. A pena
mínima seria de seis anos, mas o MP já se mostrou de acordo com a decisão do
júri e não irá recorrer.
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