São certos os danos emocionais e psicológicos causados a jovens modelos
que foram para a Índia por intermédio de agenciadores que passaram informações
falsas sobre o trabalho. Esse foi o entendimento da 1ª Turma do Tribunal
Regional Federal da 3ª Região ao condenar duas pessoas ao pagamento de
indenização por danos morais.
Nos autos, duas jovens de 19 anos e uma menor de 15 anos foram
contratadas para trabalhar como modelos na Índia, mas, no país asiático,
as promessas do contrato não foram cumpridas. Em ação civil pública, o
Ministério Público Federal pretendia, além da indenização por danos morais, que
os réus fossem proibidos de efetuar novas intermediações de negociações
destinadas a recrutar e encaminhar pessoas para o exterior.
Os depoimentos das brasileiras revelaram que elas sofreram com falta de
água na habitação, alimentação ruim e problemas de deslocamento. Uma delas teve
um problema de saúde no joelho e não recebeu a assistência adequada. Além
disso, as condições de trabalho foram diferentes do acordado, as atitudes do
contratante intimidaram as jovens e os agenciadores brasileiros não ofereceram
o suporte pactuado.
Para o MPF, os agenciadores violaram não só o Código de Defesa do
Consumidor, como também o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas
contra o Crime Organizado relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico
de Pessoas, devido ao cárcere privado e trabalho forçado das três modelos na
Índia.
Mas a tese não foi acatada pela 1ª Turma, que afirmou que a análise do
relato das próprias modelos revela que a situação não se enquadra no Protocolo.
Isso porque em nenhum momento elas sofreram exploração no sentido adotado pelo
documento: "a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de
exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas
similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos".
No depoimento ao Juiz Federal de primeiro grau, uma delas declarou que
nunca foi ameaçada ou agredida fisicamente pelo contratante indiano. Ela disse
que possuía a chave do apartamento e que todas as jovens trabalharam como
modelo. As outras afirmaram que viajaram com passagem de ida e volta, e que não
foram ameaçadas ou assediadas e que não tiveram proximidade com prostituição ou
drogas.
O relator do caso, desembargador Federal Valdeci dos Santos, citando os
artigos 3º, 6º e 14ª do Código de Defesa do Consumidor, reconheceu a
responsabilidade dos réus em razão da má prestação do serviço de intermediação.
Para o Magistrado, ainda que o cachê, as passagens aéreas, o valor recebido
semanalmente e o aluguel durante a estadia das modelos na Índia digam respeito
ao contrato firmado diretamente entre elas e a agência indiana, os réus
influenciaram diretamente nessa escolha.
Ele concluiu que as promessas dos réus não foram cumpridas,
principalmente a de assistência no caso de problemas. Também foi omitida a
jornada de trabalho e as condições de habitação na Índia. Uma das rés admitiu
em seu depoimento que sabia do problema da falta de água e, ainda assim, não
informou as modelos, destaca o voto.
A decisão ressaltou também que uma das modelos não obteve visto de
trabalho, pois tinha, à época, apenas 15 anos. Uma das rés forneceu à menor e a
seus pais a informação enganosa de que o responsável pela agência de modelos na
Índia providenciaria o visto de trabalho, o que nunca aconteceu. Além disso,
para convencer as modelos e seu pai a firmarem contrato com agências
internacionais, a ré se comprometeu a ir pessoalmente buscá-las no país onde
estivessem, caso houvesse algum problema.
Analisando os depoimentos e mensagens eletrônicas entre as modelos e os
réus, o relator entendeu que elas não foram devidamente alertadas por eles
sobre a real condição em que trabalhariam na Índia, e nem sobre os cuidados que
deveriam tomar para não correrem riscos em um país cuja cultura é muito
diferente da brasileira.
“Não obstante não haja cláusula contratual específica sobre a
responsabilidade dos réus em face do ocorrido com as modelos, entendo que esta
restou fartamente demonstrada no tocante às informações enganosas, inadequadas
e insuficientes fornecidas pelos réus, nos termos do artigo 14 do Código de
Defesa do Consumidor, com o nítido intuito de influenciar a decisão das modelos
adolescentes e de seus pais, a fim de garantir o recebimento da comissão que
lhes é cabida nesse tipo de contrato”, concluiu o desembargador, fixando em R$
10 mil o pagamento por danos morais a cada uma das modelos. Com
informações da Assessoria de Imprensa do TRF-3.
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