A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) decidiu, em ação coletiva, que o percentual máximo de multa a ser cobrada
do consumidor em caso de cancelamento de viagem, pacote ou serviço turístico
será, em regra, de 20% do valor do contrato, quando a desistência ocorrer menos
de 29 dias antes da viagem, ficando condicionada a cobrança de valores superiores
à comprovação de efetivos gastos irrecuperáveis pela agência de turismo.
A ação coletiva foi ajuizada pela Associação
Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor (Anadec) para questionar
cláusula contratual que impunha aos clientes da New Age Viagens e Turismo
Ltda., de São Paulo, a cobrança de multa entre 25% e 100% do valor do contrato
nos casos de desistência da viagem.
Ao dar provimento ao recurso da Anadec, a relatora
no STJ, ministra Nancy Andrighi, destacou que é direito básico do consumidor a
proteção contra práticas e cláusulas abusivas, configuradas em prestações
desproporcionais. Para ela, a adequação deve ser realizada pelo Judiciário, a
fim de evitar a lesão, o abuso do direito, as iniquidades e o lucro arbitrário.
Direito ao arrependimento
Segundo a ministra, os contratantes podem, no
exercício da autonomia da vontade, prever o direito ao arrependimento, à
resilição unilateral, que não acarreta o descumprimento do contrato. Nesses
casos, é estipulada uma multa penitencial, permitindo-se ao devedor o direito
de optar entre cumprir a obrigação assumida ou desistir dela, mediante o
pagamento da multa.
Para Nancy Andrighi, o valor da multa fica
submetido à autonomia da vontade dos contratantes, mas o exercício dessa
liberdade contratual deve ser balizado pela boa-fé objetiva e pela função
social do contrato.
A relatora salientou que “a multa contratual deve
ser proporcional ao dano sofrido pela parte cuja expectativa fora frustrada,
não podendo traduzir valores ou penas exorbitantes ao descumprimento do
contrato”.
Segundo ela, a jurisprudência do STJ entende ser
possível a redução equitativa da multa contratual quando seu valor for
manifestamente excessivo, para restabelecer o equilíbrio entre as partes.
Excessivamente oneroso
No caso em exame, a relatora ressaltou que havia no
contrato cláusula expressa de arrependimento, que poderia ser exercida mediante
o pagamento de multa, a qual variava conforme a antecedência com que o direito
de desistência unilateral fosse exercido pelo consumidor, variando entre 25% e
100% do total do valor pago.
A ministra reforçou a jurisprudência da corte no
sentido de que “o cancelamento de pacote turístico contratado constitui risco
do empreendimento desenvolvido por qualquer agência de turismo, não podendo
esta pretender a transferência integral do ônus decorrente de sua atividade
empresarial a eventuais consumidores” (REsp 1.321.655,
Terceira Turma).
Assim, segundo a relatora, o preço cobrado pela
agência de viagem para o exercício do direito de arrependimento abarcou, “de
modo indevido”, o risco do empreendimento, já que, “de acordo com o prazo do
cancelamento, o consumidor pode não ter direito a qualquer reembolso, mesmo que
a empresa de turismo ainda tenha, em tese, tempo hábil de repassar o serviço
objeto da contratação a terceiros”.
Nancy Andrighi entendeu que a cláusula contratual
que fixou os valores da multa está em descompasso com o previsto no Código de
Defesa do Consumidor, “por se mostrar excessivamente onerosa para a parte menos
favorecida, prejudicando o equilíbrio contratual”.
“Por esse motivo, a iniquidade das cláusulas
contratuais questionadas no presente processo é possível de ser verificada de
imediato, no âmbito coletivo, devendo apenas a delimitação dos valores
correspondentes a cada situação específica ser realizada nas ações individuais
de cumprimento da sentença coletiva genérica”, explicou a ministra.
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