As seguradoras não podem se recusar a contratar ou
renovar seguro de quem paga à vista, mesmo que a pessoa
tenha restrição financeira em órgãos de proteção ao crédito. Foi o que
decidiu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao analisar recurso da Porto
Seguro.
Para o relator, ministro Villas Bôas Cueva, a recusa de venda
direta na hipótese em questão qualifica-se como prática abusiva,
conforme o disposto no artigo 39, IX, do Código de Defesa do Consumidor.
Seguradora não pode recusar a prestação de serviços relacionada à
contratação ou renovação de seguro a quem se dispuser a fazer pagamento à
vista, ainda que possua restrição financeira.
“As seguradoras não podem justificar a aludida recusa com base apenas no
passado financeiro do consumidor, sobretudo se o pagamento for à vista, sendo
recomendável, para o ente segurador, a adoção de alternativas, como a elevação
do valor do prêmio, diante do aumento do risco, dado que a pessoa com restrição
de crédito é mais propensa a sinistros, ou, ainda, a exclusão de algumas
garantias (cobertura parcial)”, afirmou.
O Ministério Público de São Paulo ajuizou ação civil pública para
compelir a seguradora a não recusar a prestação de serviços relacionada à
contratação ou renovação de seguro a quem se dispuser a fazer pronto pagamento,
ainda que possua restrição financeira.
Para o juízo de primeiro grau, a pretensão subverteria a lógica do
mercado e o princípio da livre-iniciativa, pois incidiria sobre um aspecto
essencial do contrato de seguro, que é a análise do risco.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, por sua vez, reconheceu o caráter
abusivo da conduta da operadora de seguros. Para o TJ-SP, a anotação do nome do
consumidor em órgãos de restrição de crédito não constitui justa causa para a
recusa da contratação do seguro, em especial quando se trata de pagamento à
vista.
No recurso especial ao STJ, uma seguradora alegou, entre outros fatores,
que a recusa da contratação constitui exercício regular de direito da
seguradora, resultado da análise do risco.
O ministro Villas Bôas Cueva observou que, de fato, existem situações em
que a recusa de venda se justifica e que a análise do risco pelo ente segurador
é de primordial importância. “Se o pagamento do prêmio for parcelado, a
representar uma venda a crédito, a seguradora pode se negar a contratar o
seguro se o consumidor estiver com restrição financeira, evitando, assim, os
adquirentes de má-fé, incluídos os insolventes ou maus pagadores”, disse.
No entanto, o relator destacou a jurisprudência do STJ para recomendar a
adoção de alternativas, como a elevação do valor da apólice de seguro ou a
exclusão de algumas garantias diante do aumento do risco que a pessoa com
restrição de crédito pode agregar.
Abrangência nacional
Na decisão de segundo grau, o TJ-SP estabeleceu que a medida deveria se aplicar
em todo o território nacional, devendo haver publicidade do decreto para
assegurar o resultado prático pretendido pelo Ministério Público.
No STJ, o relator também entendeu que a decisão proferida em ação civil
pública, versando sobre direitos individuais homogêneos em relação de consumo,
possui efeito erga omnes (vale para todos), de modo a atingir
além dos limites da competência territorial do órgão julgador. Desse modo, a
decisão abrangendo todo o território nacional beneficia todas as vítimas e seus
sucessores, conforme o artigo 16 da Lei 7.347/85.
Para assegurar a efetividade da tutela, a decisão deve ser publicada no
site do Diário de Justiça e no da própria seguradora pelo
período de 20 dias.
Tutela coletiva
A seguradora também sustentou que o Ministério Público não possuiria
legitimidade ativa nem interesse de agir no caso, visto que o direito pleiteado
não é individual homogêneo, mas de natureza heterogênea.
O ministro relator, entretanto, afirmou que o Ministério Público está
legitimado a promover a tutela coletiva de direitos individuais homogêneos,
mesmo de natureza disponível, quando a lesão a tais direitos, visualizada em
seu conjunto, de forma coletiva e impessoal, transcender a esfera de interesses
puramente particulares, passando a comprometer relevantes interesses sociais.
“Consideradas a natureza e a finalidade social das diversas espécies
securitárias, há interesse social qualificado na tutela coletiva dos direitos
individuais homogêneos dos consumidores”, afirmou. “Não se está a defender em
juízo apenas um segurado em potencial, mas todos os que se encontram em
situação semelhante, a evidenciar o interesse de agir do Ministério Público”,
completou. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
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