Se o Brasil passou a aceitar a importação de produtos à base de
Canabidiol para tratamento de saúde, deve também permitir o plantio da maconha
para o mesmo fim, pois o contrário privilegiaria apenas quem tem condições
de comprar substâncias caras do exterior. Assim entendeu o juiz federal Walter
Nunes da Silva Junior, da 2ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, ao conceder
salvo-conduto para uma idosa importar sementes e cultivar cannabis para tratar
o mal de Parkinson.
Na prática, a decisão proíbe que autoridades policiais prendam ou
contenham práticas da mulher e do filho quando importarem
sementes, cultivarem e produzirem maconha para fins exclusivamente medicinais.
Além disso, os dois ficam autorizados a transportar materiais entre a casa onde
vivem e o Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
que ficará responsável por analisar a qualidade e os níveis seguros de
utilização dos extratos.
O criminalista Gabriel Bulhões Nóbrega Dias considera que
a liminar, assinada em novembro, é a primeira a reconhecer a importação de
sementes para uso geriátrico e tratamento para mal de Parkinson. Ele atuou no
caso juntamente com os advogados Carla de Morais
Coutinho, Ubaldo Onésio Silva Filho e Emilio Nabas Figueiredo.
Na petição inicial, eles contaram que a paciente foi diagnosticada em
2004 com doença degenerativa do sistema nervoso. Tomou uma série de remédios
diferentes, sem sucesso e com fortes efeitos colaterais, até que o filho
acessou vídeos de um neurocientista e a convenceu a fumar cannabis. Foi então que os tremores cessaram, para surpresa da família
e dos médicos.
O filho passou a estudar sobre o cultivo para não comprar mais maconha de
traficantes e garantir que a mãe não ingerisse substâncias tóxicas incluídas
artificialmente na produção da droga. No ano passado, com base em vídeos na
internet, passou a fabricar óleo artesanal. Os autores afirmam que, com a
ingestão e a vaporização do extrato, a paciente ganhou “nova vida” e usa
plenamente suas faculdades mentais, cognitivas e psicomotoras.
O problema, segundo eles, é que a família não tem condições de importar
óleos prontos e corre o risco de ser alvo de inquérito por tráfico de drogas a
cada importação de sementes. O juiz reconheceu então a compra e o cultivo da
matéria-prima.
Quantidade e criminalização
A liminar fixa o limite de seis plantas, consideradas suficientes para o
tratamento durante um ano (12 gotas do extrato ao dia) e de acordo com
restrição já adotada no Uruguai e no estado do Colorado, nos Estados Unidos.
Silva Junior afirmou que, embora a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) tenha retirado a cannabis sativa da lista de
drogas proibidas para fins medicinais, ainda não aceita a produção do óleo no
Brasil nem a importação da matéria-prima. Assim, segundo o juiz, “a compra do
óleo fica restrita a um público restrito, não possibilitando a todos o
exercício do mesmo direito, ferindo o direito à isonomia previsto no artigo 5º,
inciso I, da Constituição Federal, até porque é extremamente caro o tratamento
por meio da importação do medicamento ou do produto”.
Ele também defendeu que criminalizar o uso de entorpecente para consumo
próprio significa “a punição da autolesão” e “não está em compasso com o estado
democrático constitucional, que tem como pedra de toque os direitos
fundamentais”.
“Nem é preciso dizer que se está, aqui, fazendo apologia ao consumo de
drogas ilícitas. Muito pelo contrário. O que se está dizendo é que art. 28 da
Lei 11.343, de 2006, é inconstitucional em razão de criminalizar uma conduta
que não lesiona bem jurídico alheio, o que é fundamental em um sistema criminal
democrático”, escreveu.
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