Uma portadora de
transexualismo (classificado pela Organização Mundial da Saúde como CID nº 10
F64-0), obteve a alteração de seu registro civil, requerendo a alteração de seu
nome registral A.S. para o nome social de M.S., bem como para que a anotação referente
ao sexo fosse alterada de masculino para feminino, mesmo antes da realização a
cirurgia de redesignação. A ação tramitou na comarca de Chapecó (SC).
Relatou a pessoa que,
“apesar de ter nascido com órgãos sexuais
masculinos, desde a infância percebeu que seu sexo anatômico não correspondia
com sua identidade psíquica”. Considerando que estava no último ano da
Faculdade de Medicina, almejava colar grau e obter seu registro profissional
adequado ao nome que ostentava socialmente.
Os pais da pessoa
impugnaram a pretensão, salientando que não concordavam com a alteração
pretendida pela filha.
O Ministério Público
requereu que a autora da ação comprovasse se havia sido acompanhada, nos
últimos anos, por equipe multidisciplinar e se ainda possuía a firme e resoluta
intenção, ou não, de “eliminar as genitais, perdendo as
características primárias e secundárias do próprio sexo, ganhando as do sexo
oposto (feminino) – redesignação”.
Manifestou-se a
pessoa, reiterando as razões da petição inicial e esclarecendo que pretende
efetivamente ser reconhecida socialmente como do gênero feminino, sem
constrangimentos e sofrimento, assim como já se reconhece e já possui condições
psíquicas que lhe permitem viver satisfeita com suas condições físicas e
mentais.
Proferida a sentença,
em maio de 2014, foram julgados procedentes os pedidos iniciais, deferindo a
retificação do registro civil da parte autora, determinando que seu nome conste
como M.S. e o sexo FEMININO, permanecendo inalterados os demais dados.
Os pais e o representante
do Ministério Público interpuseram recursos de apelação. Nas razões recursais,
os primeiros recorrentes alegaram que conforme a Lei nº 6.015 de 1973 a mudança
de gênero no cartório de registro civil é possível somente após a realização de
cirurgia de alteração de sexo. Além disso, ressaltam que a recorrida casou-se
na qualidade de homem com uma mulher, durante o andamento da presente ação.
No recurso interposto
pelo Ministério Público a inconformidade foi pautada no argumento de que não
estariam preenchidos os requisitos do art. 3º, da Resolução nº. 1.955/2010 do
Conselho Nacional de Medicina para realização de transgenitalização, não
podendo existir a alteração registral pretendida.
No julgamento da
apelação, sob relatoria da desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho, a
Câmara Especial Regional de Chapecó do TJ-SC, homologou o pedido de desistência
do recurso dos pais da recorrida e negou provimento ao recurso do Ministério
Público.
Em seu voto, a
relatora consignou que, sob o viés do princípio constitucional da dignidade da
pessoa humana, a recorrida “considera-se mulher e a manutenção do
prenome masculino em seus documentos, continuará causando-lhe sérios
inconvenientes”. Consignou “a necessidade de oxigenação do
ordenamento jurídico, pois o direito deve adequar-se à realidade do fato social
e às mudanças de paradigmas”.
Outro detalhe da
decisão - além do fato de que a recorrida ainda não tenha se submetido à
cirurgia de transgenitalização - foi a ressalva do acórdão de que “a decisão deve ser consignada apenas e tão somente no livro cartorário
e, em hipótese alguma, na certidão de registro civil para evitar eventuais
situações discriminatórias”.
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