Apesar de a garantia do devido processo legal pressupor o rápido
desfecho do litígio, visando espancar qualquer dúvida e afinando-se com as
modernas tendências do Direito Processual, o legislador pátrio, por meio da
Emenda Constitucional 45, acabou contemplando o princípio da duração razoável
do processo, no inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, com a
seguinte redação: “A todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade
de sua tramitação”.
O direito ao processo sem dilações indevidas passou então a ser
concebido como um direito subjetivo constitucional, de caráter autônomo, de
todos os membros da coletividade (incluídas as pessoas jurídicas) à tutela
jurisdicional dentro de um prazo razoável, decorrente da proibição do non
liquet, vale dizer, do dever que têm os agentes do Poder Judiciário de
julgar as causas com estrita observância das normas de Direito Positivo.
Observe-se, em primeiro lugar, que, dada a profunda diversidade da performance da Justiça
nos vários quadrantes do Brasil, a aferição do “prazo razoável” será
absolutamente diferenciada de estado para estado, seja no âmbito da Justiça
estadual, seja no dos tribunais federais. De um modo geral, pela inarredável
falta constante de recursos materiais destinados ao Poder Judiciário, a Justiça
no Brasil é lenta.
Não obstante, é certo que todos os protagonistas do processo são
destinatários do referido princípio de índole constitucional: os juízes que
devem aplicar a lei de forma expedita, evitando delongas desnecessárias, bem
como os advogados, representantes das partes, que têm o dever profissional de
acompanhar as etapas do processo, com observância dos prazos processuais, e de não
provocar a instauração desnecessária de incidentes durante a marcha
procedimental.
Efetivou-se, outrossim, ao longo do tempo, a necessária exegese da
abrangência do supra transcrito princípio, tendo-se, unanimemente, como
“dilações indevidas”, os atrasos ou delongas que se produzem no processo por
inobservância dos prazos estabelecidos, por injustificados prolongamentos das
“etapas mortas” que separam a realização de um ato processual de outro, e,
ainda, por decisões mal proferidas, sob os aspecto formal, que têm o condão de
retardar a prestação jurisdicional definitiva.
É necessário, pois, que a morosidade, para ser reputada realmente
inaceitável, decorra do comportamento doloso de um dos litigantes, ou, ainda,
da inércia, pura e simples, ou de inescusável equívoco do órgão jurisdicional
encarregado de dirigir a realização dos diversos atos do processo. É claro que
a pletora de causas ou o excesso de trabalho não pode ser considerada,
neste particular, justificativa plausível para a lentidão da tutela jurisdicional.
No que concerne à atividade do juiz, entre os seus poderes, o artigo
139, inciso II, do Código de Processo Civil, preceitua que lhe
incumbe “velar pela duração razoável do processo”.
Saliente-se, por outro lado, que dois vícios podem determinar a anulação
ou a reforma da sentença, quais sejam, os errores in judicando e in
procedendo.
O primeiro consiste na aplicação incorreta ou imprecisa do direito
material ao caso concreto, como, por exemplo, entender que determinado ato
praticado pelo réu não é revestido de ilicitude alguma; ou que o demandado não
conseguiu provar o pagamento do crédito exigido, e assim por diante... Nessas
hipóteses, a questão diz respeito à interpretação do ordenamento jurídico,
circunstância que, na maioria das situações, concerne à convicção íntima do
juiz, no âmbito de sua independência funcional. É atividade de natureza
estritamente jurisdicional. Soberana, portanto!
Nesses casos, o tribunal, ao apreciar o recurso: i) pode perfeitamente
anular a sentença, determinando a devolução dos autos ao primeiro grau, para
que novo ato decisório seja proferido; ou mesmo ii) por força do disposto no
artigo 1.013, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil, tem a faculdade de
rejulgar a demanda, quando os autos revelarem que a causa se encontra “madura”
para receber imediato julgamento.
O error in procedendo, pelo contrário, decorre da desatenção
— às vezes reiterada — do juiz, que se desvia do modelo legal traçado pela
legislação processual. Não são raros os episódios em que o tribunal, detectando
prejuízo (ainda que presumido) causado à parte, decreta a anulação da sentença
monocrática, por variadas razões, entre elas, à guisa de exemplo:
a) sentença despida de fundamentação
adequada. Sobretudo à luz da regra do artigo 489 do novo diploma processual, os
juízes devem ser zelosos com a respectiva motivação do ato decisório. Sentença
carente de fundamentos revela, quando nada, preguiça mental de seu prolator. Em
algumas situações, nós, advogados, já sabemos de antemão que, a despeito de a
sentença favorecer nosso cliente, deverá ser inexoravelmente anulada pelo
tribunal, dada a manifesta insubsistência de motivos;
b) sentença que profere julgamento
antecipado de improcedência do pedido e, paradoxalmente, assevera que o “autor
deixou de adimplir o ônus da prova”. Decisão, a toda vista, passível de
anulação, diante da patente contradição;
c) sentença que se
esquece de enfrentar todos os pedidos e, por essa razão, é declarada infra
petita;
d) sentença que deixa de julgar
demanda incidental, como a denunciação da lide;
e) sentença proferida com manifesta
afronta ao contraditório, por violar a regra do artigo 437, parágrafo 1º, do
Código de Processo Civil.
Importa frisar que, em todas essas hipóteses, não há que se falar
em convencimento íntimo do julgador, mas, sim, em pura e evidente desatenção e
descuido do magistrado, que jamais encontram consistente justificativa.
É corrente que, em algumas situações, um dos advogados da causa,
verificando o manifesto error in procedendo, perpetrado na
audiência, tenta salvar a decisão, fazendo observar ao juiz o desvio da lei.
Todavia, invariavelmente sobrevém a resposta curta e grossa: “Doutor, se o sr.
não estiver contente com os termos da decisão, recorra”!
O pronunciamento judicial que resulta anulado pela superior instância
não acarreta consequência alguma ao juiz que o proferiu. Absolutamente nada,
nem mesmo, com razoável probabilidade, numa minoria, qualquer censura íntima ou
preocupação pessoal!
No entanto, a sentença eivada de vício, passível de anulação, não apenas
conspira contra o princípio da duração razoável do processo como
igualmente produz enorme dano a ambas as partes, com o consequente desprestígio
ao Judiciário.
Por paradoxal que possa parecer, não há qualquer norma legal
reconhecendo a responsabilidade do juiz pela má aplicação (error in
procedendo) das normas de Direito Processual.
Por certo, dois pesos e duas medidas: coitado do advogado que perde um
prazo; ou, ainda, maneja um recurso em vez de interpor aquele que realmente é o
cabível. Está perdido!
Entendo, contudo, que, diante da atuação de todo prejudicial do órgão
jurisdicional, devida a mero e reiterado desleixo, a respectiva
responsabilidade desponta objetiva, a lhe ensejar alguma sanção correcional
como medida legítima de prevenção ao aperfeiçoamento da nobre função estatal de
interpretar e aplicar o Direito!
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