Em situações na quais há dano presumido, a comprovação do prejuízo
extrapatrimonial não é necessária, pois a prova da ocorrência de ato
ilegal é suficiente. Assim entendeu a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça
ao reconhecer o dever do Estado de indenizar dois moradores do município de São
Francisco (MG) que consumiram água de um reservatório onde foi encontrado um
cadáver humano em decomposição.
O fato ocorreu em 2010 e fez com que muitas pessoas abastecidas pelo
reservatório buscassem reparações na Justiça. Em primeiro grau, as solicitações
de dano moral foram negadas. Os moradores apelaram para o Tribunal de Justiça
de Minas Gerais, mas a decisão foi mantida.
A corte regional entendeu que, embora seja desconfortável a constatação
de que havia um cadáver no reservatório, “não houve qualquer prova de que o
evento abalou psicologicamente” os moradores ou causou-lhes qualquer tipo de
dano. O tribunal ainda destacou a existência de um laudo pericial em que se
constatou que o líquido estava próprio para consumo.
Devido à nova negativa, os moradores recorreram ao STJ. Ao analisar o
caso, o ministro Humberto Martins reconheceu a responsabilidade subjetiva por
omissão da concessionária decorrente de falha no dever de vigilância do
reservatório de água. “Apesar da argumentação no sentido de que foram
observadas todas as medidas cabíveis para a manutenção da segurança do local,
fato é que ele foi invadido, e o reservatório ficou passível de violação quando
nele foi deixado um cadáver humano.”
Com o entendimento, o ministro estipulou pagamento de indenização de R$
3 mil para cada morador, acrescida de juros moratórios de 1% ao mês a partir da
data do evento danoso. A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa),
então, recorreu da decisão do STJ e a ação foi analisada pela 2ª Turma da
corte, que confirmou a posição de Humberto Martins, relator do caso.
Para o ministro, houve dano presumido (in re ipsa), o qual dispensa comprovação do prejuízo extrapatrimonial, uma vez que
é suficiente a prova da ocorrência de ato ilegal. O julgador afirmou também que
ficou caracterizada a falha na prestação do serviço, indenizável por dano
moral, quando a Copasa não garantiu a qualidade da água distribuída à
população.
O ministro avaliou como inegável a ocorrência de afronta à dignidade da
pessoa humana, “consistente no asco, angústia, humilhação e impotência da
pessoa que toma ciência que consumiu água contaminada por cadáver em avançado
estágio de decomposição. Sentimentos que não podem ser confundidos com o mero
dissabor cotidiano”.
Tema afetado
Em outro julgamento sobre a mesma questão, a 1ª Turma do STJ decidiu levar para
análise da 1ª Seção o REsp 1.418.821. A autora também é moradora de uma cidade
mineira que é abastecida por um reservatório onde um corpo, que estava há seis
meses em decomposição, foi encontrado.
Como há vários recursos sobre o mesmo fato no STJ, o relator desse caso,
ministro Napoleão Nunes Maia Filha, detectou decisões divergentes de ministros
da 1ª e da 2ª Turma e sugeriu que o processo fosse afetado à seção, que
reúne os ministros dos dois colegiados. Com
informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
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